sexta-feira, 18 de setembro de 2015

Como meditar?

A atenção plena é essencial para a prática espiritual porque, não importa qual tradição espiritual sigamos, nossa mente deve ser capaz de permanecer no momento presente, se pretendemos aprofundar nossa compreensão e experiência.

Na meditação da atenção plena, ou shamatha, tentamos alcançar a estabilidade e a calma de nossa mente.

O que começamos a descobrir é que essa calma, ou harmonia, é um aspecto natural da mente. Através da prática da atenção plena simplesmente a desenvolvemos e fortalecemos, e, como decorrência, somos capazes de permanecer em nossa mente, com tranqüilidade, sem luta. Nossa mente sente-se contente, naturalmente.

Um ponto importante é que, quando estamos no estado de atenção plena, há uma inteligência sossegada. Não é como se tivéssemos “apagado”. Às vezes, as pessoas pensam que alguém que está em meditação profunda não sabe o que está se passando, que isso seria como estar adormecido. De fato, há estados meditativos em que negamos as percepções sensoriais, mas isso não é o que se pretende realizar com a prática de shamatha.

Criar um ambiente favorável

Algumas condições são úteis para a prática da atenção plena. Quando criamos um ambiente apropriado, é mais fácil praticar.

Por pequeno que seja o espaço de que alguém disponha para meditar, em sua casa, é bom que ele tenha um sentido de elevação e sacralidade. Também se deveria meditar em um local que não fosse muito ruidoso ou perturbador, e a pessoa não deveria se encontrar em uma situação tal que sua mente possa ser facilmente incitada à raiva, ao ciúme ou a outras emoções. Se ela estiver perturbada ou irritada, a prática será afetada.

Iniciando a prática

Encorajo as pessoas a meditarem freqüentemente, mas por curtos períodos de tempo — 10, 15 ou 20 minutos. Quando se força muito, a prática pode adquirir muita “personalidade”, e o treinamento da mente deveria ser muito, muito simples. Assim, pode-se meditar 10 minutos pela manhã e 10 minutos à tarde, e durante esses períodos realmente trabalhar com a mente. Depois, simplesmente pare, levante-se e vá embora.

Muitas vezes nos deixamos cair sobre a almofada para meditar e permitimos que a mente nos leve para qualquer lugar. Devemos criar um senso de disciplina. Quando sentamos para meditar, podemos recordar-nos: “Estou aqui para trabalhar com minha mente. Estou aqui para treinar minha mente”. É correto dizer isso a si próprio, literalmente, quando se senta para meditar. Precisamos desse tipo de inspiração quando começamos a praticar.

Postura

A abordagem budista é que a mente e o corpo estão ligados. A energia flui melhor quando o corpo está ereto, pois, quando ele está curvado, o fluxo é modificado e isso afeta diretamente nosso processo de pensar. Assim, há uma yoga que lida com isso. Não estamos sentados eretos porque estamos tentando ser bons alunos na escola; nossa postura realmente afeta nossa mente.

Pessoas que necessitam de uma cadeira para meditar devem sentar-se eretas, com os pés tocando o chão. As que usam uma almofada de meditação, como um zafu ou um gomden, devem encontrar uma posição confortável, com as pernas cruzadas e as mãos pousadas sobre as coxas, com as palmas para baixo. Os quadris não estão nem muito inclinados para a frente, o que cria tensão, nem inclinados para trás, de forma que a pessoa comece a se encurvar. Deve-se ter uma sensação de estabilidade e força.

Quando nos sentamos, a primeira coisa que precisamos fazer é verdadeiramente ocupar nosso corpo — verdadeiramente, ter um senso de nosso corpo. É freqüente que nos estaquemos, imóveis, e façamos de conta que estamos praticando. Mas não podemos nem sentir nosso corpo, não podemos nem sentir onde ele se encontra. Em vez disso, é necessário que estejamos bem aqui. Assim, quando se inicia uma sessão de meditação, pode-se dedicar algum tempo no começo da prática a arrumar a postura. Pode-se imaginar que a espinha está sendo puxada para cima, do topo da cabeça, de forma que a postura seja alongada para, então, se acomodar.

O princípio básico é manter uma postura elevada, ereta. A pessoa está numa situação sólida: os ombros estão nivelados, os quadris estão nivelados, a espinha está bem empilhada. Ela pode ver-se a empilhar os ossos na ordem certa e a deixar que os músculos pendam dessa estrutura. Usamos essa postura para permanecer relaxados e despertos. A prática que estamos fazendo é muito precisa: deve-se estar muito desperto, embora calmo. Quando notamos que estamos ficando entorpecidos, ou caindo no sono, devemos verificar a postura.

O olhar

Para uma prática de atenção plena estrita, o olhar deve estar voltado ligeiramente para baixo, enfocando algo a uma pequena distância à frente do nariz. Os olhos estão abertos mas não arregalados; o olhar deve ser suave. Estamos tentando reduzir o estímulo sensorial tanto quanto possível. Pergunta-se: “Não deveríamos ter uma sensação do ambiente?”. Mas, nesta prática, esta não é uma preocupação nossa. Estamos apenas tentando trabalhar com a mente e, quanto mais elevarmos o olhar, mais distraídos ficaremos. É como se tivéssemos uma lâmpada acima da cabeça a iluminar o ambiente e, subitamente, nós a enfocássemos diretamente à nossa frente. Estamos intencionalmente ignorando o que se passa ao nosso redor. Estamos confinando o cavalo da mente em um curral menor.

A respiração

Quando praticamos shamatha, familiarizamo-nos cada vez mais com nossa mente e, em particular, aprendemos a reconhecer os seus movimentos, que experimentamos como pensamentos. Fazemos isso utilizando-nos de um objeto de meditação que nos fornece um contraste ou contraponto ao que se está passando na mente. Logo que nos distraímos e começamos a pensar em algo, o objeto da meditação nos traz de volta. Poderíamos colocar uma pedra à nossa frente e usá-la para enfocar a mente, mas usar a respiração como o objeto da meditação é particularmente útil porque isso nos relaxa.

Quando começamos a prática, tomamos conhecimento de nosso corpo, temos um sentido de onde ele está e, então, começamos a notar nossa respiração. A sensação completa de respirar é muito importante. A respiração não deve ser forçada, obviamente; respira-se naturalmente. A respiração entra e sai, entra e sai. Relaxamos a cada respiração.

Os pensamentos

Não importa que tipo de pensamento venha a surgir, a pessoa deve dizer a si mesma: “Este pode ser um assunto verdadeiramente importante em minha vida, mas agora não é o momento de pensar nisso. Agora, estou praticando meditação”. Nisso se resume quão honestos somos, quão verdadeiros podemos ser com nós mesmos, durante cada sessão.

Todos se perdem em pensamentos, algumas vezes. Poderíamos pensar: “Não acredito que tenha ficado tão absorto em algo assim”, mas devemos tentar não fazer disso um assunto demasiadamente pessoal. Apenas tentemos ser tão imparciais quanto possível. A mente, às vezes, ficará turbulenta e teremos de aceitar isso. Não podemos nos pressionar. Se estivermos tentando nos ver completamente livres de conceitos, sem nenhum discurso, é melhor desistirmos, isso simplesmente não vai acontecer.

Assim, simplesmente utilizando o processo de rotular, percebemos nosso discurso. Notamos que nos perdemos em pensamentos, rotulamos isso como “pensando” — delicadamente e sem julgamentos — e retornamos à respiração. Quando temos um pensamento — não importa quão selvagem ou bizarro ele possa ser —, simplesmente deixamos que ele passe e voltamos à respiração, voltamos à situação do aqui, agora.

Cada sessão de meditação é uma viagem de descoberta para compreender a verdade básica de quem somos nós. No começo, a lição mais importante da meditação é perceber a velocidade da mente. No entanto, a tradição de meditação diz que a mente não precisa ser desse jeito: ela apenas não foi trabalhada.

Estamos falando de um assunto muito prático. A prática da atenção plena é simples e completamente factível. E, por estarmos trabalhando com a mente que experimenta a vida diretamente, ao sentarmo-nos, simplesmente, sem nada fazer, já estaremos dando um passo enorme.

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